A votação do Supremo Tribunal Federal, favorável ao Recurso Extraordinário 511961, que extinguiu a exigência de diploma de curso superior específico para o exercício da profissão de jornalista deu uma idéia precisa de como a atividade é considerada na mais alta corte do país. No voto do relator, ministro Gilmar Mendes, a profissão foi comparada não à Medicina, à Engenharia ou ao Direito, mas à Culinária. No voto do ministro Cezar Peluso, o jornalismo foi comparado a atividades como a de babá e a de modelo de passarela.
Já o ministro Carlos Ayres Britto afirmou que o jornalismo carece de uma verdade científica e, por isso, não pode ser comparado a profissões que exigem formação em curso superior. Os votos ignoraram 40 anos de existência de legislação (Decreto-lei 972/69) que exigia o diploma de curso superior específico para o exercício da profissão de Jornalista, como lembrou o ministro Marco Aurélio, único dos nove votos favorável ao diploma para jornalistas.
A votação ignorou também todo um esforço trabalhista e acadêmico-científico tão antigo quanto o decreto, perpetrado por jornalistas, cursos superiores, estudantes, professores e pesquisadores brasileiros. Exemplos desses esforços são a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), a Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação ((Intercom), o Fórum Nacional de Professores de Jornalismo (FNPJ) e a Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor).
A questão agora é o que fazer com o resultado desses esforços diante da desregulamentação legal da profissão de jornalista. A resposta: aumentar os esforços para garantir a qualidade técnico-cientifica dos jornalistas, estudantes e pesquisadores e manter a luta contra as condições precárias de trabalho. A pesquisa sobre Jornalismo no Brasil vem aumentando gradativamente nos últimos anos, consolidando conceitos e teorias e ajudando a traçar os rumos da atividade. A Fenaj e os sindicatos estaduais, como o de Santa Catarina, têm recebido e encaminhado denúncias de más condições de trabalho.
Mas e os estudantes? Por que freqüentariam quatro anos de curso superior se o diploma não é mais necessário para o exercício do jornalismo? Porque esta foi uma decisão restrita à legislação. E a legislação nem sempre corresponde às práticas sociais. Nenhum tribunal deve decidir de que maneira as pessoas vão se realizar pessoal e profissionalmente. Assim, aqueles que se sentem vocacionados para o jornalismo devem procurar bons cursos superiores para o exercício qualificado da profissão. Assim como aqueles que se sentem vocacionados para a culinária ou seguem o padrão de beleza próprio das passarelas devem procurar o máximo de qualificação em suas atividades.
Há uma diferença, no entanto, entre jornalistas, modelos e chefes de cozinha. Que me perdoem Gisele Bünchen e o chef Alex Atala, mas jornalismo de qualidade é fundamental para o aperfeiçoamento da democracia e a promoção da cidadania. E exercer uma profissão comprometida com esses dois princípios exige mais do que bom gosto ou um corpo adequado ao circuito da moda.
4 comentários:
Acredito que o próprio mercado, cada vez mais exigente em todas as áreas, irá (e acho que já está) optar por jornalistas com formação acadêmica. Assim como em todas as outras profissões é necessário realmente saber o que está fazendo. E acredito que somente a prática não é suficiente. Precisamos estudar, discutir e fomentar a prática acadêmica do Jornalismo. Não será uma lei que impedirá que isto aconteça.
Parece-me que esta votação mostrou o quanto se tem uma visão errada do jornalista e da prática jornalística.
Arteche, em sua opinião, há chances desta decisão ser revertida, ou seja, o diploma voltar a ser obrigatório?
Acredito que estes ministros só vão se dar conta do que fizeram quando eles próprios forem alvo de jornalistas sem diploma, contratados apenas porque sabiam escrever "bonito". Quando seus nomes forem usados sem os princípios da ética, da verdade e da imparcialidade. Mas então será tarde demais. O jornalismo no Brasil já estará contaminado. Agora, mais do que nunca, o verdadeiro jornalismo e os veículos sérios irão se diferenciar daqueles que acreditam que a liberdade de expressão está acima de tudo.
É isso aí, meninas. Se depender de vocês, a coisa está bem encaminhada em relação ao jornalismo brasileiro, apesar dos tribunais...
Quando terminei minha 1ª graduação em PP, vi colegas perderem espaço de trabalho p/ moleques c/ habilidades em Corel e Photoshop que se prostituindo no mercado e queimavam a nossa classe ao se intitular: Publicitários.
Um ponto forte que me fez cursar JOR foi à regulamentação da profissão. Ter o reconhecimento dela.
Pela 2ª vez sinto o amargo gosto de me graduar e ser tratado c/ tanto desdenho por parte do STF. Deixamos de ser uma classe p/ nos tornar um amontoado.
Só nos resta continuar exercendo nosso trabalho c/ toda a qualidade que um jornalista, c/ canudo, sabe fazer.
E mostrar, na pratica, que quatro anos de faculdade é suficiente p/ separar o joio do trigo. Ou melhor, o Jornalista Acadêmico do Jornalista Pirata.
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